COMUNICADO DE IMPRENSA
Tribunal Administrativo da Província de Tete decidiu indeferir liminarmente o pedido de pagamento de uma indemnização de trezentos noventa e nove milhões de meticais à comunidade de Cassoca pela JINDAL
I. CONTEXTUALIZAÇÃO
A Ordem dos Advogado de Moçambique (OAM), por meio de uma acção popular, requereu ao Tribunal Administrativo da Província de Tete, em Outubro de 2019, a condenação da empresa JINDAL, no pagamento de indemnizações e compensações por danos materiais directos e danos não patrimoniais, no valor total de 399.690.329,28Mts (trezentos noventa e nove milhões seiscentos noventa mil trezentos vinte nove meticais e vinte e oito centavos) a favor de 289 famílias da comunidade de Cassoca, afectadas pela exploração de carvão mineral pela JINDAL no Distrito de Marara, na Província de Tete.
Através do Acórdão n.º 06/TAPT/2020, de 13 de Março, referente aos autos do processo n.º 47/2019/CA, o Tribunal Administrativo da Província de Tete indeferiu liminarmente o pedido de indemnização formulado pela OAM, alegadamente por ser evidente que a pretensão da OAM não pode proceder.
II. FUNDAMENTOS DA ACÇÃO DA OAM
A OAM fundamentou este pedido de indemnização na sistemática e contínua violação dos seus direitos humanos das comunidades em causa, tendo sempre em conta o incumprimento do plano de reassentamento, pela JINDAL. Os direitos violados incluem: o direito ao reassentamento e compensações justas; direito à habitação condigna; direito à terra produtiva para a prática de agricultura; direito à saúde, ao ambiente, à educação, a fontes alternativas de rendimento e à segurança alimentar pela criação de condições para o efeito, bem como à criação de condições para garantir o acesso à energia eléctrica; isto para além, do direito ao transporte, a cemitérios, a fontes de abastecimento de água e a espaços de diversão e à prática do culto religioso, tudo isto desde o ano de 2012 à data da submissão do requerimento ao tribunal, ou seja, 2019. De tudo o acima exposto, dizia o requerimento da OAM, resulta que a JINDAL tem a obrigação de reparar os danos causados às comunidades em causa.
III. BREVE OLHAR SOBRE O ACÓRDÃOº 06/TAPT/2020, DE 13 DE MARÇO
Numa primeira fase, o Tribunal Administrativo da Província de Tete, através do Despacho N.º 08/TAPT/19, de 29 de Outubro de 2019, sobre os autos da Acção Popular n.º 47/2019/CA, intentada pela OAM, decidiu rejeitar liminarmente o pedido apresentado pela OAM, em representação das comunidades acima referidas, alegando a improcedência das pretensões da requerente.
Resumidamente, o Tribunal Administrativo da Província de Tete refere que num outro processo, intentado pela OAM naquele tribunal, a mineradora JINDAL fora condenada, através do Acórdão n.º 54/TAPT/, de 14 de Dezembro, referente aos autos de processo n.º 38/2017, a concluir o reassentamento no prazo de 18 meses. Tendo decorrido o prazo fixado pelo tribunal e havendo incumprimento da decisão, na opinião do tribunal, há que lançar mão à competente acção executiva para fazer cumprir o plano de reassentamento das comunidades afectadas e não formular o pedido de indemnização que resulta da acção popular interposta pela OAM contra a JINDAL.
Não se conformando com esse Despacho, porque sem qualquer fundamento legal plausível, a OAM recorreu[i] do mesmo, estranhamente, ao mesmo tribunal que proferiu o despacho, porque assim determina a Lei n.º 7/2014, de 28 de Fevereiro (Lei que regula os Procedimentos Atinentes ao Processo Administrativo Contencioso).
Em resposta definitiva, de primeira instância, isto é, do Tribunal Administrativo da Província de Tete, este Tribunal proferiu o Acórdão n.º 06/TAPT/2020, de 13 de Março, que decidiu manter o supra mencionado Despacho n.º 08/TAPT/19, de 29 de Outubro, alegando ser legal.
Em bom rigor, nesta acção popular com vista à indeminização das comunidades afectadas pela JINDAL, a OAM não pretende a efectivação do reassentamento justo a que a JINDAL foi condenada através do Acórdão n.º 54/TAPT/, de 14 de Dezembro. São duas realidades diferentes, embora conectadas pela condenação da JINDAL neste Acórdão n.º 54/TAPT. Ambas as realidades consubstanciam violação sistemática e contínua dos direitos humanos das famílias afectadas perpetrada pela JINDAL. O pedido da OAM nesta acção Popular não pode ser satisfeita colocando mão à acção executiva, porque estaria a extrapolar a decisão do Acórdão n.º 54/TAPT, que apenas condena a JINDAL a efectivar o reassentamento justo e se dedica ao pagamento de indemnizações pelos danos causados às famílias em causa.
IV. CONCLUSÃO
O Tribunal Administrativo da Província de Tete não percebeu que mesmo que a JINDAL tivesse concluído o processo de reassentamento após ter sido condenada para o efeito, através do Acórdão n.º 54/TAPT, não haveria qualquer impedimento para a formulação do pedido de indemnização a favor das comunidades em causa, por violação dos seus direitos no contexto do processo de reassentamento em questão, tendo em conta o Plano de Reassentamento aprovado.
A decisão do Tribunal Administrativo da Província de Tete, proferida através do Acórdão n.º 06/TAPT/2020, de 13 de Março, é juridicamente bastante problemática, mas também assustadora, tendo em conta as regras da hermenêutica jurídica e de aplicação do Direito. A decisão proferida pelo tribunal protege a mineradora JINDAL, em detrimento dos direitos fundamentais das comunidades em causa.
Por uma Ordem Inclusiva, Dinâmica e Descentralizada.
Maputo, 23 de Abril de 2020
A Comissão dos Direitos Humanos da OAM
[i] Em abono da verdade deveria ser reclamação