Venerando Presidente do Tribunal Supremo
Veneranda Presidente do Tribunal Administrativo
Veneranda Presidente do Conselho Constitucional
Digníssima Procuradora-Geral da República
Digníssimo Provedor de Justiça
Sua Excelência Ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos;
Sua Excelência Presidente do Conselho Municipal da Cidade de Maputo
Ex.mos Senhores Convidados e Altos Dignatários aqui presentes
Caros colegas, Advogados, Advogados Estagiários, Magistrados e Oficiais de Justiça
Minhas Senhoras e meus Senhores,
Em meu nome e em representação de todos os membros da nossa Ordem agradeço a presença de todos vós neste acto, que marca o início de celebração da Semana do Advogado. É, para nós, um gesto significativo ter, no lançamento destas celebrações, os mais altos representantes das magistraturas, e a presença do Governo, demonstração da relevância do nosso papel, enquanto um dos pilares do nosso sistema de justiça.
Não poderia deixar de começar por endereçar os mais sentidos pêsames à família do Ilustre Dr. Conceição Sebastião Hong-Sing, membro da OAM falecido no passado Sábado, 12 de Setembro de 2020, em circunstâncias ainda não devidamente conhecidas. Os nossos votos de pesar estendem-se a todos os familiares de colegas Advogados falecidos.
Como sabeis, comemoramos, hoje, dia 14 de Setembro, o Dia do Advogado Moçambicano, data da criação da Ordem dos Advogados de Moçambique (em 14 de Setembro de 1994). Já lá vão 26 anos! Sendo assim vão os nossos calorosos votos de parabéns a todos os Advogados e Advogados Estagiários. Que o exercício da profissão seja motivo de grande orgulho e de realização por aquilo que representa, e que sejam, mais e mais, o espelho de uma profissão que é distinta, cheia de nobreza e de crucial relevância social pelo papel que o Advogado desempenha.
Infelizmente, não era este o contexto em que gostaríamos de celebrar o nosso Dia e a Semana do Advogado. Não há memória, num passado mais recente, de os países partilharem à escala global e numa mesma dimensão, tanta incerteza quanto ao seu futuro mais próximo, especialmente, no que concerne à soluções a adoptar, para lidar da melhor forma possível com a Covid-19, nem tão-pouco quanto à posição real em que se encontrarão no pós-Covid-19. A eclosão desta pandemia lançou-nos a todos para a maior de todas as incertezas em várias gerações.
Foi neste contexto que os actuais titulares dos órgãos da Ordem dos Advogados assumiram os seus mandatos. É neste contexto que os advogados, profissionais essencialmente liberais, têm que se reinventar para, não obstante todas as limitações, continuarem a prestar a devida assistência jurídica e judiciária a quem dela precisar.
A nossa profissão, tal como sucedeu com a esmagadora maioria dos demais sectores da nossa economia, foi fortemente impactada. A adopção das necessárias medidas, para prevenção e mitigação da Covid-19, resultou na redução significativa da actividade económica, da implementação de projectos, com destaque para os que pressupõem o investimento directo estrangeiro. Estes motivos, combinados com as necessárias limitações da actividade das entidades públicas e privadas, bem como com a adopção do regime de férias judiciais, determinaram uma redução significativa da actividade dos nossos membros, nas diversas áreas do direito em que actuam.
Ao nível dos serviços da Ordem dos Advogados os impactos não podiam ser menos relevantes. À título de exemplo, foram suspensas várias actividades vitais à existência da Ordem, tal é o caso dos estágios profissionais de acesso à profissão, que colocaram 872 candidatos à advogado, com os seus estágios suspensos e o seu futuro profissional adiado.
Com o fim do Estado de Emergência, e não obstante as medidas em curso para a materialização dos programas da Ordem dos Advogados, incluindo a retomada dos estágios, permanecem várias incertezas relativamente ao futuro.
No começo destas nossas celebrações, iremos, igualmente, iniciar um processo de reflexão sobre o exercício da profissão e, mais amplamente, sobre o funcionamento da administração da justiça, num contexto como este. Queremos contribuir para a construção de soluções, que permitam a adaptação da profissão, por um lado, e do sistema de administração de justiça, no seu todo, a este novo normal.
Entendemos, dentre outras iniciativas, que deveremos prosseguir, rapidamente, para o processo de adaptação à esta nova normalidade, através de soluções que incluam o recurso às Tecnologias de Informação e Comunicação, o que requer que repensemos, com urgência, nas nossas leis processuais e no funcionamento dos tribunais e demais instituições que formam o aparelho judicial. Estes deverão, por exemplo, estar preparados para receber e expedir documentos, à partir de correspondência electrónica, realizar diligências virtuais, bem assim disponibilizar jurisprudência em plataformas online.
A Ordem dos Advogados já está a dar os primeiros passos nessa direcção, através da criação de um site de atendimento on-line, e o desenvolvimento de outras iniciativas, que permitam manter o necessário distanciamento social, sem prejudicar o nosso papel de prover assistência jurídica e judiciária e garantir aos cidadãos o acesso à justiça.
Actualmente, com 1875 membros, a Ordem dos Advogados iniciou nos mandatos antecedentes, um processo de descentralização, marcado, essencialmente, pela instituição de Conselhos Provinciais e a criação de condições estatutárias para o efeito. Presentemente, com a recente realização de eleições para os Conselhos Provinciais de Gaza e Tete, o processo de descentralização já atingiu a escala nacional.
Ao longo deste mandato continuaremos a dar prioridade a este processo de descentralização da Ordem dos Advogados, através da aprovação de instrumentos, que permitam o funcionamento adequado dos Conselhos Provinciais. Pugnaremos pela criação de condições para a sua efectiva implantação, transferência progressiva de competências e afectação dos necessários recursos, a fim de que os serviços da Ordem dos Advogados sejam prestados aos seus membros e aos cidadãos à escala nacional.
Pretendemos, igualmente, que a Ordem reforce o seu papel para com os seus próprios membros. Neste sentido, focar-nos-emos em oferecer, cada vez mais, aos Advogados e Advogados Estagiários serviços com impacto no exercício da profissão, nomeadamente a disponibilização de ferramentas de trabalho, tais como bases de dados de legislação, o Boletim Informativo da Ordem, bem assim os pacotes de benefícios adicionais, não previstos no Estatuto, através de acordos com terceiros, tal como o acesso a seguros diversos, em termos competitivos, como recentemente tivemos a oportunidade de anunciar e que resulta de uma parceria com uma seguradora nacional.
Excelências, Distintos Convidados e Ilustres Colegas,
No que tange ao que sucede para além da Ordem, o Advogado não se pode manter indiferente perante alguns sinais claros e evidentes de um eminente retrocesso, no que tange à garantia de direitos e liberdades fundamentais, na nossa sociedade.
Registar, investigar, acompanhar, denunciar, prestar assistência, defender, repudiar, indignar-se e promover mudanças com impacto significativo na vida dos cidadãos, é a abordagem que decidimos adoptar, neste triénio do nosso mandato, no que respeita à defesa dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos.
Mas não o faremos sozinhos!
Permitam-me socorrer-me das palavras de Benjamim Burombo: “Todas as vezes que quero lutar pelos direitos africanos, uso apenas uma mão. Porque a outra está ocupada a afastar africanos, que estão lutando contra mim”.
É que o Advogado, sendo uma peça fundamental do sistema de administração da justiça, necessita que lhe sejam asseguradas todas as condições institucionais para o exercício da profissão, com liberdade, independência, segurança e, acima de tudo, com respeito às suas prerrogativas funcionais.
Em resposta às diversas ameaças que o exercício da profissão tem estado a sofrer, foi criada a Comissão de Defesa e Reforço das Prerrogativas dos Advogados, que funciona com representantes ao nível de todos os Conselhos Provinciais, para que, independentemente do local onde possa ocorrer a ameaça, a reacção seja coordenada, harmonizada, colectiva e institucional. A violação das prerrogativas de um advogado deve merecer a indignação e a condenação de toda a classe.
Nos últimos tempos, um pouco por todo o país e, em particular na cidade da Beira, alguns ilustres colegas Advogados, domiciliados no Conselho Provincial de Sofala, estão a ser processados criminalmente por alguns magistrados judiciais, em virtude de estes nossos colegas terem deduzido participações disciplinares contra aqueles magistrados junto do Conselho Superior da Magistratura Judicial que, entretanto, foram arquivados por motivos diversos.
Sem intenção de generalizações, algumas destas situações têm sinais evidentes de intimidação, perseguição e limitação à liberdade de exercício da advocacia e, por razões éticas e deontológicas, não citaremos os nomes dos ilustres colegas envolvidos.
De todo o modo, estamos a trabalhar em coordenação com o Tribunal Supremo para que, respeitando a independência do judiciário, encontremos uma plataforma de prevenção de crispação entre Advogados e Juízes, pois consideramos não fazer sentido que, em todos os casos em que os juízes deduzam participações disciplinares contra Advogados que, analisados os factos, não tenham provimento, seja lícito e razoável os Advogados requererem a abertura de processos-crime contra aqueles magistrados.
Aliás, importa aqui recordar que, em nosso entendimento, os actos praticados pelos magistrados em exercício de funções jurisdicionais não lhe são pessoalmente imputáveis, mas sim ao juiz enquanto função.
As preocupações mais profundas dos Advogados e Advogados Estagiários não se limitam às acima enunciadas. Com efeito, o regresso da onda de sequestros, cada vez mais frequentes, e maioritariamente ainda não esclarecidos, não só alimentam o mastro da insegurança, mas também retraem o investimento.
De igual modo, os brutais ataques à liberdade de imprensa e de expressão e ao exercício do jornalismo, com os graves eventos recentes de ameaças e ataques a jornalistas em Cabo Delgado e o incêndio que resultou de fogo posto nas instalações do jornal Canal de Moçambique, crimes ainda não esclarecidos, agravam um ciclo de violações da liberdade de imprensa que impõem, a cada um de nós como membros da sociedade e, como Advogados, em particular, o redobrar de esforços e uma cada vez maior vigilância no sentido de proteger, com a tenaz resistência e responsabilidade, o amplo núcleo de direitos que a Constituição da República confere à todos os cidadãos .
Não teremos, pois, mãos a medir para repudiar, combater e condenar cada centímetro da nossa liberdade que nos for sequestrada.
Por outro lado, a violência policial e o uso excessivo da força por parte dos agentes da PRM e, nos últimos tempos, também da Polícia Municipal, deixou de ser ocasional e tende a transformar-se em estrutural e consolidada, na forma de actuação da corporação em violação dos direitos humanos e das suas funções constitucionais. A Ordem dos Advogados vem acompanhando e monitorando estes casos, bem como prestando a devida assistência às vítimas, com vista à responsabilização dos agentes envolvidos, e também para assegurar a devida compensação das vítimas e suas famílias. Apelamos ao Ministério do Interior uma maior abertura e colaboração para, em conjunto, revertermos este cenário.
Por fim, mas não menos importante, queremos, mais uma vez, lançar um sonoro apelo à toda a sociedade contra um dos mais graves ataques à profissão de advogado: a procuradoria ilícita. A procuradoria ilícita não é só aquela praticada por advogados estrangeiros sem a devida autorização e nem aquela que é promovida por entidades públicas, em concursos públicos, para a contratação de advogados estrangeiros, com vista a prestar serviços que, nos termos do Estatuto da Ordem dos Advogados consubstanciam actos próprios da profissão e, por isso, reservados à prestação da actividade de advogado. Referimo-nos, igualmente, àquela procuradora ilícita que, por vezes, é promovida por ilustres colegas nossos ou com a cumplicidade destes, reduzindo o espaço de intervenção da nossa classe. Não mediremos esforços no seu combate e queremos contar com o apoio de todos vós.
Ilustres colegas Advogados e Advogados Estagiários,
Reitero os parabéns pelo nosso Dia e convido-os a participar, à escala nacional, do vasto programa de comemorações, incluindo os programas de cada um dos Conselhos Provinciais. Não deixemos que a Covid-19 seja um impedimento.
Excelências e Distintos Convidados,
Estendo, em nome de todos os advogados, o convite a que se juntem à nós para as celebrações da Semana do Advogado, participando nos diversos eventos, que irão decorrer ao longo da Semana de Advogado, cujo programa já foi partilhado e consta do site da Ordem dos Advogados de Moçambique.
Um Feliz Dia do Advogado Moçambicano para todos!
Muito obrigado!
Por Uma Ordem Inclusiva, ao Serviço do Advogado e do Estado de Direito Democrático
O Bastonário
Duarte Casimiro