OAM

Tribunal Administrativo da Província de Tete condena a mineradora Vale Moçambique e o Estado Moçambicano, pela violação dos direitos das comunidades afectadas pela exploração do carvão mineral, através do Acórdão N.º 09/TAPT/19

I. CONTEXTUALIZAÇÃO
A Ordem dos Advogado de Moçambique (OAM), na sequência do projecto que está a levar a cabo, através da sua Comissão dos Direitos Humanos, de Monitoria Legal dos Direitos sobre a Terra e Segurança Alimentar das Comunidades Afectadas pelos Grandes Investimentos, processou, no ano de 2017, a Vale Moçambique e o Estado Moçambicano, no Tribunal Administrativo da Província de Tete, em defesa dos direitos das comunidades afectadas pela actividade mineira da Vale Moçambique.
Num processo que durou dois anos, o Tribunal Administrativo da Província de Tete, através do Acórdão n.º 09/TAPT/19, considerou provados os fundamentos de facto e de direito apresentados pela OAM relativamente às condutas, quer da Vale Moçambique, quer do Estado Moçambique, através do seu órgão executivo.

II. FUNDAMENTOS DA ACÇÃO DA OAM
Das suas pesquisas, a OAM encontrou situações e elementos inequívocos da falta de salvaguarda dos direitos fundamenais de inúmeras famílias afectadas e reassentadas em resultado da exploração do carvão mineral no distrito de Moatize, quais sejam:
 Acesso À terra produtiva, segurança alimentar;
 Dignidade humana;
 Habitação condigna
 Indemnizações a que essas comunidades têm direito nos termos da lei.
As condições de habitação nas zonas de reassentamento são precárias e problemáticas, as terras atribuídas às famílias afectadas são pedregosas e impróprias para a prática da agricultura, para além do facto das mesmas comunidades enfrentarem problemas sérios de fome, acesso à água e fontes alternativas de rendimento ou de subsistência, tendo em conta o impacto negativo que a exploração do carvão mineral causou nas suas condições de vida.
Nos termos da Lei de Minas, por um lado, a Vale Moçambique é obrigada a indemnizar as comunidades afectadas pelas suas actividades de forma justa e transparente. Por outro, compete ao Governo proteger as comunidades onde as actividades de exploração mineira estão autorizadas e promover o desenvolvimento sócio- económico em prol do bem-estar das mesmas.

III. PEDIDO FORMULADO DA OAM
Em defesa dos direitos das comunidades afectadas em causa, a OAM pediu ao Tribunal Administrativo da Província de Tete, que reconhecesse os direitos e interesses legítimos das mesmas e que condenasse a mineradora Vale Moçambique e o Estado Moçambicano:
• No pagamento, pela Vale Moçambique, do valor total das indemnizações a que as comunidades afectadas têm direito, como resultado da perda das suas terras e oficinas de produção de tijolos por parte dos oleiros, que resultaram da exploração do carvão mineral em Tete pela Vale Moçambique;
• Na atribuição, pelo Estado Moçambicano, de terra produtiva e na atribuição, pela Vele Moçambique, de habitação condigna, tudo de modo a materializar um reassentamento justo, nos termos da lei;
• No pagamento, pelo Estado Moçambicano, da percentagem de 2,75% a que as comunidades têm direito em virtude da actividade mineira levada a cabo pela Vale em Moatize, tal como estabelece o artigo 20 da Lei de Minas, conjugado com a norma prevista na Lei que em cada ano aprova o Orçamento do Estado, relativamente às receitas provenientes da actividade mineira.

IV. DECISÃO PROFERIDA PELO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DA PROVÍNCIA DE TETE
Através do Acórdão N.º 09/TAPT/19, o Tribunal Administrativo da Província de Tete condenou a Vale Moçambique a reconstruir todas as casas com problemas, que haviam sido construídas no âmbito do processo de reassentamento, obedecendo aos padrões previstos na casa modelo apresentada às comunidades afectadas, no prazo de 120 dias; condenou também o Estado Moçambicano, por via do seu Governo, a canalizar a receita gerada para o Estado pela extracção mineira às comunidades situadas nas áreas de exploração, na percentagem fixada na lei do Orçamento do Estado, conforme previsto na Lei de Minas e na Circular n.º 01/MPD-MF/2013, dos Ministros da Planificação e Desenvolvimento e das Finanças, cujos poderes estão hoje concentrados no Ministro da Economia e Finanças.

Quanto às indemnizações e/ou compensações relacionadas com as perdas de oficinas de tijolos dos oleiros, a perda de terra produtiva e outras infra-estruturas sociais, como vias de acesso, escolas, hospitais, água, transporte, espaço para a prática de desporto, o Tribunal entende que a Ordem dos Advogados não conseguiu demonstrar que tais pretensões não foram devidamente satisfeitas.

V. CONCLUSÕES:
O presente Acórdão representa um avanço relativamente à litigância de interesse público em defesa dos direitos humanos das comunidades em Moçambique.
No âmbito das suas atribuições legais, designadamente “defender o Estado de Direito Democrático, os direitos e liberdades fundamentais…”, “promover o acesso à justiça, nos termos da Constituição e demais legislação” e “…promover o respeito pela legalidade” – cfr. as alíneas a), b) e d) do artigo 4 do Estatuto da OAM, aprovado pela Lei n.º 28/2009, de 29 de Setembro, a Ordem dos Advogados de Moçambique continuará a lutar para melhor defesa dos interesses daquelas comunidades afectadas pelo carvão mineral e, também, para que se cumpra o Acórdão condenatório.

Por uma Ordem Dinâmica, Inclusiva e Descentralizada!

A Comissão dos Direitos Humanos da OAM

 

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